No dia 7 de fevereiro, o Ministério da Educação – MEC encaminhou ofício às universidades federais alertando que manifestações políticas nas instituições de ensino podem configurar “imoralidade administrativa” e serem alvo de punições disciplinares. A orientação é baseada numa recomendação de 2019 do procurador-chefe da República em Goiás, Ailton Benedito de Souza, na qual o procurador afirma que “uma manifestação política contrária ou favorável ao governo representa malferir o princípio da impessoalidade”.
Segundo a citação do MEC ao texto do procurador, caberia punição a comentário ou ato político ocorrido “no espaço físico onde funcionam os serviços públicos; bem assim, ao se utilizarem páginas eletrônicas oficiais, redes de comunicações e outros meios institucionais para promover atos dessa natureza”.
O advogado da RCSM Advocacia Pedro Henrique Koeche Cunha, entretanto, destaca que os servidores têm direito de se manifestar politicamente garantido pela Constituição. A Carta Magna traz no seu artigo 5º o “direito à liberdade” e destaca, no seu inciso IV, que “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”. No seu artigo 220, o texto constitucional reforça que “a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição”.
– O ofício encaminhado pelo MEC é mais um exemplo da forma como o Governo Federal atua para calar os professores, os servidores técnicos, os estudantes e a comunidade acadêmica das universidades e dos institutos federais e demonstra, novamente, o autoritarismo e o desapreço pela democracia do Presidente da República – observa Pedro.
Nesta semana, a Controladoria-Geral da União – CGU publicou os extratos de dois Termos de Ajustamento de Conduta – TAC assinados pelo ex-reitor da Universidade Federal de Pelotas – UFPel e coordenador das pesquisas de prevalência do Coronavírus no Brasil, Pedro Curi Hallal, e pelo pró-reitor de Extensão da universidade, Eraldo dos Santos Pinheiro. Eles foram alvo de processos preliminares abertos a partir de uma denúncia do deputado Bibo Nunes (PSL-RS). Nos documentos, eles se comprometem a não realizar manifestação “desrespeitosa e de desapreço” em relação ao presidente da República, Jair Bolsonaro, por dois anos.
É importante relembrar, contudo, que em 2018 o Supremo Tribunal Federal – STF garantiu, em processo julgado à unanimidade, a livre manifestação do pensamento e das ideias em universidades. A ADPF 548 foi ajuizada pela procuradora-geral da república, Raquel Dodge, contra decisões de juízes eleitorais que determinaram a busca e a apreensão de panfletos e materiais de campanha eleitoral em universidades e nas dependências das sedes de associações de docentes, proibiram aulas com temática eleitoral e reuniões e assembleias de natureza política, impondo a interrupção de manifestações públicas de apreço ou reprovação a candidatos nas eleições gerais de 2018 em universidades federais e estaduais. Em um trecho do voto condutor do julgamento, a relatora da decisão, Ministra Cármen Lúcia, consignou que “impedir a manifestação do diferente e à livre manifestação de todas as formas de apreender, aprender e manifestar a sua compreensão de mundo é algemar as liberdades, destruir o direito e exterminar a democracia”.
– Não será um procurador da república ou um TAC que impedirão a comunidade acadêmica de se manifestar. Inclusive, a liberdade de expressão, a autonomia universitária e a liberdade de cátedra já foram asseguradas e reafirmadas em diversas situações pelo Supremo Tribunal Federal e por outros tribunais brasileiros. Qualquer tipo de medida do Governo Federal no sentido de calar as instituições e os seus servidores é ilegal e passível de questionamento na via administrativa e judicial – reforça o advogado Pedro Henrique Koeche Cunha.