O cenário inédito, consequência dos meses de combate à pandemia, tem gerado muitas dúvidas sobre obrigações dos docentes na volta das aulas no modo remoto em diferentes instituições de ensino. No próximo dia 15 de setembro, o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul retoma as atividades pedagógicas não presenciais de forma provisória e emergencial.
Como forma preventiva, a RCSM Advocacia preparou um documento em conjunto com o Sindoif-RS para orientar professores sobre questões que farão parte da rotina a partir de agora, por tempo indeterminado. A advogada Luísa Gomes Rosa faz o alerta: “Os questionamentos dos docentes são legítimos. Há preocupações relativas às atividades dos docentes, mas que podem ter reflexos diretamente na qualidade do ensino. Neste documento que preparamos, procuramos incluir vários temas que estão sendo observados em outras instituições. Porém, existem questões inéditas que podem surgir no decorrer das aulas. Portanto, é fundamental que a instituição esteja aberta para atender às demandas dos professores e alunos”.
Confira o documento na íntegra
IMPLEMENTAÇÃO DAS ATIVIDADES PEDAGÓGICAS NÃO PRESENCIAIS NO ÂMBITO DO IFRS – CONSIDERAÇÕES INICIAIS DA ASSESSORIA JURÍDICA DO SINDOIF – SEÇÃO SINDICAL DO ANDES-SN NO IFRS
A partir da aprovação da regulamentação das atividades pedagógicas não presenciais no âmbito do Conselho Superior do IFRS, da qual resultou a edição da Resolução nº 038, de 21 de agosto de 2020 pela referida instância do IFRS, a assessoria jurídica da Seção Sindical do ANDES-SN no IFRS apresenta, a pedido da Diretoria do Sindicato e visando auxiliar e resguardar juridicamente os/as docentes do IFRS, as seguintes considerações iniciais:
1 – DA NÃO OBRIGATORIEDADE DE ADOÇÃO DAS ATIVIDADES PEDAGÓGICAS NÃO PRESENCIAIS
A adoção provisória e emergencial de atividades pedagógicas não presenciais no âmbito do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul é situação nova e jamais adotada anteriormente – ao menos nesse patamar – no IFRS, daí decorrendo legítimos questionamentos de docentes a respeito da obrigatoriedade e da possibilidade/viabilidade de adesão ao novo formato por cada docente.
Ressalta-se, de início, que não existe qualquer obrigação legal de adesão às atividades pedagógicas não presenciais por parte dos/das docentes e departamentos do IFRS. Nesse sentido, a própria Resolução nº 038/2020 do CONSUP prevê de forma cristalina a possibilidade de não adesão a tais atividades em diversos artigos. Cita-se, de início, o artigo 10 da resolução (grifo nosso):
Art. 10. Será de responsabilidade de cada campus a definição das atividades curriculares a serem desenvolvidas por meio de atividades pedagógicas não presenciais, considerando-se as características dos componentes curriculares, dos conteúdos a serem desenvolvidos, dos recursos tecnológicos necessários e garantia da igualdade de condições para acesso e permanência dos estudantes.
§1º. A avaliação sobre quais componentes curriculares são passíveis de serem desenvolvidos por meio de atividades pedagógicas não presenciais é prerrogativa dos docentes que ministram o componente, com análise dos colegiados dos cursos, que organizarão a oferta das atividades e realizarão a escuta dos estudantes às quais se destinam.
[…]
§3º. A definição de que trata o caput deverá levar em consideração a garantia da acessibilidade e das devidas adaptações curriculares nas atividades pedagógicas não presenciais, não podendo ser permitida a oferta de componentes curriculares ou módulos de ensino cuja acessibilidade e adaptações não possam ser garantidas.
Importante destacar, no ponto, que, nos termos do § 1º do artigo 10 supra, o texto aprovado pelo Conselho Superior do IFRS atribui expressamente aos e às docentes a avaliação sobre quais atividades poderão ser realizadas de forma não presencial, deixando nítido, assim, que trata-se de decisão que deve passar previamente por uma análise de viabilidade por parte do/da docente. É dizer, aqui, que caso o/a docente constate que determinada atividade não possui garantia de acessibilidade – seja por parte do/da docente, seja por parte dos/das discentes – que possibilite o ensino não presencial, é um dever do próprio IFRS acolher o entendimento pela impossibilidade de desenvolvimento do respectivo componente/atividade pedagógica (nesse sentido é expresso o § 3º do artigo 10 supra) na referida modalidade.
Relevante mencionar, ainda, que em diversos pontos da Resolução em debate restou estabelecido que a avaliação da viabilidade/efetividade da adoção das atividades não presenciais deverá ser realizada de forma contínua, permitindo, assim, posteriores decisões pela impossibilidade da adoção do ensino não presencial em situações em que se vislumbre, na prática, a sua ineficácia/inviabilidade. Nesse sentido dispõem os artigos 15, 21 e 35 da Resolução (grifos nossos):
Art. 15. […]
§ 1º. O período de vigência da oferta das atividades pedagógicas não presenciais será analisado em função da avaliação institucional sobre sua efetividade e o contexto da pandemia, sendo competência do Conselho Superior do IFRS esta definição.
§ 2º. Caberá aos campi, por meio dos docentes, dos estudantes, das equipes pedagógicas e da gestão do ensino, a realização de avaliação permanente acerca da efetividade e qualidade dos processos de ensino e aprendizagem.
Art. 21. São atribuições dos docentes que ministram as atividades pedagógicas não presenciais:
[…]
VII – Comunicar ao Setor Pedagógico ou equivalente e ao Coordenador de Curso problemas identificados no decorrer do processo de ensino e aprendizagem.
Art. 35. Nos casos em que o colegiado do curso entender que as atividades práticas presenciais são essenciais ao cumprimento dos objetivos de aprendizagem constante nos Projetos Pedagógicos dos Cursos, estas deverão ser realizadas de forma presencial, através da participação dos discentes nos componentes curriculares desenvolvidos no retorno presencial, ou através de plano de estudos próprio, desenvolvido especificamente para o grupo de estudantes que antecipou os estudos teóricos.
Os artigos em questão permitem, nesse sentido, que mesmo após uma adesão inicial às atividades pedagógicas não presenciais, tal decisão possa ser revista/alterada a partir da constatação de que, na prática e no dia-a-dia educacional, a continuidade de atividades em tal modalidade não é possível/eficaz em formato não presencial.
Assim, certo é que o próprio IFRS previu, através da regulamentação das atividades pedagógicas não presenciais pelo CONSUP, a possibilidade de que docentes, campus e cursos não adiram ao ensino não presencial, podendo os/as docentes que assim entenderem manifestarem-se nesse sentido a fim de possibilitar a adoção das medidas internas/administrativas cabíveis para que não haja a implementação da referida modalidade nos seus respectivos componentes/atividades.
Para além das características próprias das atividades pedagógicas/componentes que podem inviabilizar a adesão ao ensino não presencial, cabe, nesse ponto, elencar uma série de situações particulares que podem impossibilitar que o/a docente exerça sua função através da via não presencial, citando-se, a título exemplificativo, (i) a impossibilidade de acesso aos meios e instrumentos adequados; (ii) dificuldades de manipulação de equipamentos de ordem virtual e de processos complexos de criação de novos modelos de ensino/aprendizagem nesse formato de ensino; (iii) o caso de o/a docente estar com problemas de saúde (inclusive considerando-se aqui o contexto de avanço da pandemia de COVID-19 no Estado do Rio Grande do Sul), originados ou não pelo trabalho na Universidade, agravados pelas impossibilidades reais, postas pela pandemia, de se obter assistência médica correta para possível pedido formal de licença médica; (iv) obrigações a efetivar intensos serviços domésticos e de cuidados com filhos, parentes idosos (pais, irmãos, irmãs, maridos, esposas, companheiros/as) ou pessoas com deficiência, assumidos em decorrência do distanciamento social; dentre inúmeras outras possibilidades.
Nesse cenário, vale destacar que independentemente das decisões das instâncias organizativas internas (campus, colegiados dos cursos, etc.) do IFRS que devem deliberar sobre a adesão ao ensino não presencial, o/a docente pode declarar formalmente ao Instituto e às instâncias administrativas/acadêmicas pertinentes a impossibilidade prática de adesão a tal modalidade (o que inclusive está previsto na própria normativa aprovada, conforme o já mencionado § 1º do Artigo 10 da Resolução). A exigência de adesão e/ou da prática de ações de ensino não presencial para esses e essas docentes pode configurar prática de assédio moral por parte do IFRS.
Com efeito, o assédio moral consiste na exposição de trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras, que ofendem a sua dignidade e integridade física e mental, em situações geralmente repetitivas e prolongadas, durante o horário de trabalho e no exercício das suas funções. Trata-se, portanto, de toda conduta que humilha, ridiculariza, menospreza, inferioriza, rebaixa, ofende o servidor ou trabalhador, causando-lhe sofrimento físico ou psíquico.
Para Marie-France Hirigoyen, médica psiquiátrica francesa e principal referência intelectual no campo de estudos teóricos e pesquisas sobre assédio moral, tal ocorrência assim pode ser definida (grifo nosso):
Por assédio em um local de trabalho temos que entender toda e qualquer conduta abusiva manifestando-se sobretudo por comportamentos, palavras, atos, gestos, escritos que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, pôr em perigo seu emprego ou degradar o ambiente de trabalho.[1]
Guarda especial relevância, neste ponto, a atenção a outro artigo constante na normatização aqui abordada. Trata-se do texto do Artigo 2º, III, da Resolução nº 038/2020 (grifo nosso):
Art. 2º. A adoção de atividades pedagógicas não presenciais deve considerar os seguintes princípios:
[…]
III – Preservação da integridade e da saúde da comunidade do IFRS, em aspectos físicos e socioemocionais.
Ao prever que a preservação da integridade e da saúde da comunidade do IFRS – aqui incluídos, por óbvio, os/as docentes – em aspectos físicos e socioemocionais é um dos princípios que devem reger a adoção de atividades pedagógicas não presenciais, o IFRS está comprometendo-se, aqui, a evitar quaisquer práticas que configurem assédio moral à sua comunidade.
Nessa perspectiva, e de acordo com as normas supratranscritas, é de se concluir que as atividades pedagógicas não presenciais não podem ser impostas como obrigação aos/às docentes que entenderem pela inviabilidade prática de tal modalidade, podendo eventual “pressão” nesse sentido configurar assédio no ambiente de trabalho, daí resultando inclusive a possibilidade de condenação judicial do IFRS e/ou dos/das agentes praticantes do eventual assédio.
2 – DO USO DE ESTRUTURA DOMÉSTICA E PESSOAL PARA VIABILIZAR AS ATIVIDADES DE ENSINO
Diante da adoção das atividades pedagógicas não presenciais pelo IFRS, é recorrente a preocupação de docentes a respeito da necessidade de aquisição de estrutura/equipamentos que viabilizem a ministração de aulas/atividades por meio virtual. É necessário destacar, quanto a esse ponto, que quaisquer gastos financeiros realizados por docentes para que a realização de atividades pedagógicas não presenciais seja possível devem ser custeados exclusivamente pelo IFRS.
É relevante destacar, no ponto, que a adoção do ensino não presencial pode levar à necessidade de aquisição de novos mecanismos/bens para viabilizar a realização das atividades. Nesse sentido prevê a própria a Resolução aqui abordada (grifo nosso):
Art. 18. São recursos didáticos e ferramentas educacionais digitais passíveis de serem utilizadas para as atividades pedagógicas não presenciais:
I – Ferramentas assíncronas, como videoaulas, fotos, filmes e vídeos com envio de links, podcasts, murais colaborativos (padlet), fóruns, blogs, mapas mentais colaborativos, animações, entre outros.
II – Ferramentas síncronas, como sistemas de webconferência, teleconferência, chats, plataforma de troca de mensagens em tempo real, que possibilitem a interação.
III – Materiais digitais, como livros didáticos e paradidáticos, livros de literatura, jornais, revistas, obras literárias, apostilas, artigos científicos, entre outros elaborados pelos docentes e acessíveis de modo on-line ou off-line, disponibilizados através do e-mail institucional, sistema acadêmico, ou do Google Drive.
A própria Resolução nº 038/2020 também prevê a necessidade de o IFRS atentar aos meios necessários para a realização das atividades pedagógicas não presenciais. Nesse sentido é o art. 16 da referida normatização (grifo nosso):
Art. 16. Cada Campus analisará, em trabalho conjunto entre Coordenação de Curso, Direção de Ensino, Setor Pedagógico ou equivalente, e Núcleos de Educação a Distância (NEaD), a necessidade de formação e assessoramento aos docentes e discentes e os meios de realizá-la, com o intuito de atender as especificidades para o desenvolvimento das atividades pedagógicas não presenciais.
Para além do devido reembolso dos gastos com a obtenção de aparelhos, meios e equipamentos tecnológicos e de infraestrutura (como são os exemplos de dispositivos móveis, computadores, planos de dados, eventuais bens móveis, etc.), o Instituto tem o dever de orientar os/as servidores/as quanto às condições de ergonomia física e de trabalho.
Quanto ao ponto, merece destaque a Norma Regulamentadora 17, Portaria MTb 3214, de 8 de junho de 1978, em especial quanto aos equipamentos, mesas, cadeiras e a postura física, valendo destacar, da referida norma, seus pontos 17.3.2 e 17.3.3, abaixo transcritos (grifo nosso):
17.3.2 Para trabalho manual sentado ou que tenha de ser feito em pé, as bancadas, mesas, escrivaninhas e os painéis devem proporcionar ao trabalhador condições de boa postura, visualização e operação e devem atender aos seguintes requisitos mínimos:
a) ter altura e características da superfície de trabalho compatíveis com o tipo de atividade, com a distância requerida dos olhos ao campo de trabalho e com a altura do assento;
b) ter área de trabalho de fácil alcance e visualização pelo trabalhador;
c) ter características dimensionais que possibilitem posicionamento e movimentação adequados dos segmentos corporais.
17.3.3 Os assentos utilizados nos postos de trabalho devem atender aos seguintes requisitos mínimos de conforto:
a) altura ajustável à estatura do trabalhador e à natureza da função exercida;
b) características de pouca ou nenhuma conformação na base do assento;
c) borda frontal arredondada;
d) encosto com forma levemente adaptada ao corpo para proteção da região lombar.
O Ministério Público do Trabalho elaborou a Nota Técnica – GT COVID 19 – 11/2020, que tratou especificamente da “atuação do Ministério Público do Trabalho na defesa da saúde e demais direitos fundamentais de professoras e professores quanto ao trabalho por meio de plataformas virtuais e/ou em home office durante o período da pandemia da doença infecciosa COVID-19”. Ao abordar as normas ergonômicas e de condições de trabalho e a necessidade de adequação dos equipamentos para a realização de aulas virtuais, a referida Nota apontou expressamente que as Instituições de Ensino que adotarem as aulas virtuais têm a obrigação de atuar “oferecendo ou reembolsando os valores dos bens necessários à garantia da integridade física”.
Nesse cenário, é de responsabilidade do IFRS a aquisição, a manutenção e o fornecimento dos equipamentos tecnológicos e de infraestrutura necessários ao exercício das atividades não presenciais, bem como o reembolso de eventuais despesas feitas pelos e pelas docentes a esse título, tudo de forma a possibilitar o acesso pelos e pelas docentes, no exercício de seu trabalho perante o IFRS, a computadores, internet, ambiente virtual eficiente e demais bens essenciais para atender às necessidades das atividades pedagógicas não presenciais.
É recomendável, diante de tudo o que foi mencionado neste ponto, que os/as docentes façam um levantamento de todos os gastos financeiros realizados com a compra de insumos, bens e meios tecnológicos/de infraestrutura para viabilizar a adoção de atividade pedagógicas não presenciais, permitindo-se, assim, o posterior pedido de reembolso dos valores pertinentes junto ao IFRS.
3 – DA PROTEÇÃO AOS DIREITO AUTORAIS E DE IMAGEM E À LIBERDADE DE CÁTEDRA
A adoção de atividades pedagógicas não presenciais suscita importantes debates acerca da proteção à liberdade de cátedra e aos direitos autorais (proteção de todas as obras intelectuais criadas e materializadas por um/a autor/a) e de imagem (direito da personalidade de todo o ser humano, compreendendo a reprodução da imagem de alguém) dos/das docentes, sobretudo num contexto nacional de crescente perseguição política, com especiais reflexos na atividade docente. É de se registrar, no ponto, as recentes notícias de ataques ocorridos em atividades pedagógicas virtuais no âmbito da Universidade Federal de Santa Maria[2], do próprio Instituto de Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul[3] e da Universidade Federal de Pelotas[4]
É importante alertar que a Resolução nº 038, de 21 de agosto de 2020 carece de normas ou previsões protetivas específicas com relação aos direitos autorais e de imagem, nada dispondo quanto ao tema.
Independentemente da ausência de regulamentação específica, cumpre destacar que é dever do IFRS a adoção de todas as medidas necessárias para a proteção da liberdade de cátedra e dos direitos autorais e de imagem dos/das docentes. Importante, nesse cenário, salientar que a implementação de atividades pedagógicas não presenciais deve atentar a questões relevantes como (i): a vedação da realização de gravações de atividades remotas sem a prévia autorização específica dos/das docentes e dos/das demais envolvidos/as; (ii): a vedação da utilização dos materiais disponibilizados em aula para qualquer outra finalidade sem a prévia autorização específica dos/das docentes e dos/das demais envolvidos/as; e (iii): a vedação da disponibilização, por quaisquer meios, dos dados, da imagem e da voz dos/das docentes sem a prévia autorização específica dos/das docentes e dos demais envolvidos/as.
Eventual gravação das atividades pedagógicas não presenciais pelo IFRS e a sua posterior utilização devem observar, em todas as esferas e espaços, os parâmetros e fundamentos da disciplina do uso da internet, com especial atenção ao que estabelece o art. 2º da Lei nº 12.965/2014 (Marco Civil da Internet), que assim dispõe (grifo nosso):
Art. 2º A disciplina do uso da internet no Brasil tem como fundamento o respeito à liberdade de expressão, bem como:
I – o reconhecimento da escala mundial da rede;
II – os direitos humanos, o desenvolvimento da personalidade e o exercício da cidadania em meios digitais;
III – a pluralidade e a diversidade;
IV – a abertura e a colaboração;
[…]
VI – a finalidade social da rede.
Assim, a legislação determina expressamente que a adoção de atividades pedagógicas não presenciais no âmbito do IFRS deve partir dos fundamentos de respeito à liberdade de cátedra, aos direitos humanos, à pluralidade e à diversidade, sendo dever do IFRS adotar as medidas necessárias para que tais direitos sejam efetivamente resguardados no contexto das atividades pedagógicas não presenciais.
Visando concretizar os direitos docentes aqui abordados, a já mencionada Nota Técnica – GT COVID 19 – 11/2020 do Ministério Público do Trabalho bem apontou que as Instituições de Ensino que adotarem o ensino remoto possuem o dever de (grifo nosso):
(i): Garantir o respeito ao direito de imagem e à privacidade do corpo docente;
(ii): Exigir consentimento prévio e expresso de docentes para a produção de atividades acadêmicas a ser difundido em plataformas virtuais abertas, extracurriculares, em que sejam utilizados dados pessoais (imagem, voz, nome) ou material pedagógico produzido pelo profissional;
(iii): Observar a liberdade de cátedra nos ambientes virtuais, não diferenciando-a de uma sala de aula presencial para fins de ensino e administração do ambiente educacional, devendo-se garantir a permanência exclusiva dos(as) professores(as), auxiliares ou equipe de docentes nas salas virtuais, sendo o ingresso de demais integrantes do quadro escolar (supervisores, diretores) somente permitido, em caráter excepcional e emergencial, com autorização prévia da(o) docente ministrante da respectiva aula;
(iv) Advertir discentes, docentes, responsáveis e supervisoras(es) e demais pessoas que tenham acesso à aula ou ao material dela decorrente, da proibição de fotografar, gravar, registrar, compartilhar ou divulgar, por qualquer outro meio, a imagem ou a voz ou conteúdo autoral do professor, evitando-se o uso indevido de seus direitos da personalidade e/ou autorais.
(v) Proteger os direitos autorais do(a) professor(a), como o conteúdo das aulas e o material de apoio produzido para disciplina, como slides e apostilas, contra divulgação ou reprodução sem sua prévia autorização, sob pena de violação direitos autorais, tal como previsto Lei n. 9.610/1998, sobre direitos autorais.
Cumpre ao IFRS, ainda, coibir e combater a prática de quaisquer tipos de intimidações sistemáticas nos ambientes virtuais de ensino, garantindo especial proteção aos/às servidores/as a ele vinculados a partir da adoção de atividades pedagógicas não presenciais e das novas possibilidades e formas de intimidação daí decorrentes, sempre a partir das perspectivas da liberdade de cátedra e de respeito aos direitos humanos. Cita-se, por pertinente, o que dispõe o art. 2º da Lei nº 13.185/15 quanto ao tema (grifo nosso):
Art. 2º Caracteriza-se a intimidação sistemática (bullying) quando há violência física ou psicológica em atos de intimidação, humilhação ou discriminação e, ainda:
I – ataques físicos;
II – insultos pessoais;
III – comentários sistemáticos e apelidos pejorativos;
IV – ameaças por quaisquer meios;
V – grafites depreciativos;
VI – expressões preconceituosas;
VII – isolamento social consciente e premeditado;
VIII – pilhérias.
Parágrafo único. Há intimidação sistemática na rede mundial de computadores (cyberbullying), quando se usarem os instrumentos que lhe são próprios para depreciar, incitar a violência, adulterar fotos e dados pessoais com o intuito de criar meios de constrangimento psicossocial.
Assim, é de responsabilidade do IFRS adotar todas as medidas cabíveis (com especial destaque às proteções acima mencionadas) para resguardar os direitos à liberdade de cátedra e aos direitos autorais (cuja inobservância configura violação legal, nos termos da Lei nº 9.610/89) e de imagem dos/das docentes que aderirem às atividades pedagógicas não presenciais.
4 – CONCLUSÃO
Conforme mencionado, a adoção de atividades pedagógicas não presenciais é novidade atípica e repentina no âmbito do IFRS, daí decorrendo inclusive a ausência de normatizações mais aprofundadas a respeito do tema. Independentemente disso, a adoção de tal modalidade de atividades não pode gerar quaisquer violações aos direitos constitucionais e legais dos/das docentes, sendo responsabilidade do IFRS adotar as medidas necessárias para garantir, na prática, o respeito às normas e aos direitos aqui pontuados.
Sendo estas as considerações iniciais a serem realizadas quanto ao tema, esta assessoria jurídica fica à disposição para complementar a presente análise e/ou para responder a outras questões suscitadas pelo SINDOIF e/ou pela categoria docente.
[1] HIRIGOYEN, Marie-France. Assédio Moral: a violência perversa do cotidiano. Rio de Janeiro: Bertand Brasil, 2006, p. 65.
[2] Disponível em: <https://www.ufsm.br/2020/07/07/nota-da-ufsm-sobre-incidente-em-aula-aberta/>. Acesso em 26 de ago. de 2020.
[3] Disponível em: <https://ifrs.edu.br/rolante/nota-de-repudio-aos-ataques-ocorridos-em-atividades-pedagogicas-virtuais-nos-campi-restinga-e-porto-alegre-do-ifrs/>. Acesso em 26 de ago. de 2020.
[4] Disponível em: < https://gauchazh.clicrbs.com.br/educacao-e-emprego/noticia/2020/08/candidata-a-reitora-da-ufpel-e-alvo-de-ataques-racistas-em-reuniao-virtual-cke4cmndw002a013g780u2jhx.html>. Acesso em 26 de ago. de 2020.