Por Thiago Mathias Genro Schneider e Pedro Henrique Koeche Cunha
Circula um vídeo em que a ex-presidenta Dilma Rousseff, em seu discurso na Câmara Federal no dia da votação do impeachment, analisa as razões pelas quais estava sendo enxotada do poder e projeta o que aconteceria nos anos seguintes. Pimba! Com altíssimo nível de acerto em suas projeções, somos os telespectadores da decadência avassaladora do Estado brasileiro em todas as suas dimensões: social, política, econômica e cultural.
A relação capital-trabalho tem um capítulo de destaque neste cenário. A “reforma” trabalhista, como segundo ato do aniquilamento das garantias sociais mínimas – o primeiro ato foi a implementação do teto de gastos – foi a condutora de um processo de submissão da classe trabalhadora ao poder do capital que, aliada ao derretimento da economia no país, está gerando desemprego, diminuição de renda e uma informalidade do mercado de trabalho nunca vista antes. São os desprotegidos de garantias mínimas, que os entusiastas da reforma e parte importante da mídia preferiram chamar de empreendedores.
No início de setembro, a Gerdau, gigante mundial da produção de aço e derivados, que dispensa maiores apresentações, decidiu que seus trabalhadores e trabalhadoras da produção da unidade de Charqueadas deveriam ter alterado seu regime de trabalho com a implementação de turnos fixos, ao contrário dos turnos ininterruptos de revezamento, que vinham sendo realizados desde 1974, ou seja, há quase 40 anos! Esta alteração resulta na diminuição imediata da remuneração de 30%, em média, de seus empregados, além de provocar profundas mudanças de ordem pessoal e familiar, na medida em que alguns trabalhadores, por exemplo, executarão sua jornada sempre à noite, o que, sabemos, incide diretamente e negativamente em nosso organismo e afeta a convivência familiar.
Paralelamente a isto, a empresa noticia lucros recordes que foram de R$ 2,5 bilhões no 1° trimestre e de R$ 3,4 bilhões no 2° trimestre, deixando que os números falem por si a respeito das razões pelas quais as condições de trabalho e de vida de seus “colaboradores” pioram enquanto apresenta saúde financeira invejável. Os verdadeiros produtores desta riqueza estão recebendo seu prêmio de consolação: salário rebaixado, mas emprego mantido!
Este é apenas um exemplo que ilustra a necessidade da forte regulação estatal necessária para que estas distorções não sejam cada vez mais frequentes e radicalizadas, sob pena de estarmos diante de uma neoescravidão, onde o chicote foi abolido, mas o trabalho continuará cada vez mais difícil, penoso e miserável. Convém lembrar, numa dessas ironias da vida, que o empresário Jorge Gerdau foi coordenador da Câmara de Gestão e Planejamento do governo de Dilma Rousseff, o que serve de alerta – uma vez mais – para a problemática política de conciliação entre trabalho e capital, cuja aspiração maior está invariavelmente centrada no lucro.
Resta aos trabalhadores da Gerdau, que não podem contar com o socorro de um presidente minimamente decente e cujo Ministro da Economia atende exclusivamente aos interesses do grande capital, buscar que as medidas ilegais da empresa sejam impedidas pela Justiça do Trabalho – esta sólida e necessária instituição brasileira que os donos do poder ainda não conseguiram extinguir. Que a Justiça esteja à altura do seu papel de bem regular o constante conflito entre o capital e o trabalho, preservando a remuneração dos trabalhadores frente à insaciável ganância do grande capital, que novamente busca aumentar o lucro de poucos acionistas milionários em detrimento da remuneração de centenas de trabalhadores que sustentam suas famílias.
Artigo publicado no site Sul21
Foto: Samir Oliveira/PSOL