*Advogado – artigo publicado no Sul 21
O Supremo Tribunal Federal iniciou terça-feira (19/08) o julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n° 722, ajuizada pela Rede Sustentabilidade, que busca suspender investigação sigilosa do Ministério da Justiça e Segurança Pública contra cidadãs e cidadãos – em sua maioria servidores públicos – identificados em suas redes sociais como integrantes de movimentos políticos antifascistas.
Duas questões chamam a atenção nesta atitude tomada pelo Governo Bolsonaro. A primeira é a preocupante contradição revelada quando o Estado, sob à égide do sigilo (necessário em circunstâncias cuja apuração de crimes e delitos podem enfraquecer a investigação), realiza a produção de dossiês para identificação e monitoramento de brasileiras e brasileiros que se autointitulam antifascistas. Além do desnecessário uso dos serviços de “inteligência” nas redes sociais, já que estas propiciam identificação imediata com o movimento, através de fotos, textos e os tais avatares em seus perfis, fica a pergunta: qual a natureza política de um Estado que investiga e persegue indivíduos que se autointitulam antifascistas?
Outro fato importante é que a grande maioria dos investigados são servidores públicos – grande pedra no sapato de governos autoritários na política e liberais na economia – já que no caso do Brasil a Constituição Federal garantiu a estabilidade do cargo público após o cumprimento de alguns requisitos, exatamente para que o corpo administrativo estatal realize suas funções sem interferência do “governo de momento”. Trata-se de uma política de Estado, aliás muito atacada pelos defensores da meritocracia.
Convém lembrar que a Controladoria Geral da União editou norma, em julho passado, que regula punição para servidores que emitissem opiniões “acerca de conflitos ou assuntos internos, ou de manifestações críticas ao órgão ao qual pertença”.
É fundamental, portanto, que o STF determine não apenas a suspensão de quaisquer atos no sentido de produzir, compartilhar e investigar pessoas por suas opiniões difundidas nas redes sociais, mas também no sentido de apurar a conduta dos agentes públicos que determinaram esta investigação, sob pena de ir se conformando em nossa sociedade a ideia de que o Estado pode violar direitos e garantias individuais com o aval de quem justamente deve proteger estes primados constitucionais.
Há uma frase pichada numa rua em Porto Alegre que diz: “o fascismo bate à porta, não deixe ele entrar”…deve ser antiga, pois a porta já está aberta e ele já entrou. Cabe a nós não servirmos este indigesto jantar.