Quem acompanha minimamente o funcionamento dos serviços públicos e conhece ao menos um pouco como é estruturado o orçamento da União, estados e municípios ficou perplexo com a forma de divulgação de um estudo elaborado pelo Instituto Millenium. Diferentes veículos do Grupo Globo apresentaram o levantamento nesta segunda-feira (10), como estratégia de apoio do projeto “Destrava!”. A proposta tem como objetivo acelerar a apresentação e tramitação de uma Reforma Administrativa, que retira direitos dos servidores públicos e diminui a participação do Estado em áreas estratégicas como Saúde e Educação.
A forma como o estudo foi apresentado demonstra que a verdade não é uma premissa para o desdobramento do debate. Começamos pela origem do Instituto Millenium, que entre seus fundadores estão reconhecidos porta-vozes da agenda neoliberal no Brasil, como os ex-presidentes do Banco Central Armínio Fraga e Gustavo Branco, além do economista Paulo Guedes. Sim, Paulo Guedes, atual ministro da Economia. Os grupos RBS, Gerdau e Suzano e instituições financeiras como a Porto Seguro e o Bank of America estão na lista de empresas que financiam a instituição.
No estudo em si, a perplexidade surgiu com a coragem na forma da apresentação. Distorcendo os dados, o Instituto Millenium concluiu que o Brasil gasta 13,7% do PIB com os salários dos servidores públicos, enquanto os gastos com educação ficam em 6% e saúde em 3,9%. Para os especialistas que elaboraram o estudo, os salários de enfermeiros e médicos, por exemplo, não estão nos valores previstos para a saúde. Assim como o salário de um professor universitária não está no valor previsto para a educação.
Algumas perguntas que ficam: existe atendimento e tratamento de saúde sem médicos e enfermeiros? Existe ensino sem professores? Ou segurança pública sem policiais?
Tem mais uma pergunta que não é respondida no estudo: quanto de juros o Brasil paga a banqueiros?
O novo ataque ao serviço público repete a mesma estratégia utilizada para aprovação das reformas Trabalhista e da Previdência, um suposto excesso de gastos que impediria a aplicação de recursos em setores estratégicos. Os anos passam e os efeitos prometidos com a aprovação das propostas nunca apareceram. E nem vão aparecer.
Ao fim e ao cabo, o objetivo mesmo é continuar criando uma cortina de fumaça para evitar que o Brasil coloque em prática a taxação das grandes fortunas, medida prevista na Constituição de 88. Ou que efetua um verdadeiro combate à sonegação. Infelizmente não são pautas que despertem o interesse do Instituto Millenium.
Guilherme Pacheco Monteiro – Advogado
Artigo publicado originalmente no jornal Sul 21.